quinta-feira, dezembro 29, 2005

"O Processo" - Kafka

Acabei de ler o livro "O Processo" de Kafka. Deixo alguns links à vossa disposição para que possam ter um ideia sobre esta "angustiante" obra. Mas vale a pena ler...

Links:
Caderno de Anotações
Nave da Palavra
Oficina Multimédia

sexta-feira, dezembro 09, 2005

O livro

"- Como é que te não chegou ainda a notícia de que um livro é de um tempo que já morreu? de que é do tempo da memória e que a memória findou? Escrever um livro imagina o tempo de vida que se perdeu. E lê-lo devagar, com notas à magem. E guardá-lo em estantes como um cadáver num jazigo."

Vergílio Ferreira, em "Para Sempre"

quinta-feira, dezembro 01, 2005

Cavalgar

"Tinha-se decidido a cavalgar em frente porque não podia voltar para trás e o mundo nesse dia era tão belo como noutro dia qualquer e cavalgava para a sua própria morte."

Cormac Maccarthy, em "Filho de Deus"

terça-feira, novembro 01, 2005

Destino mortal

"E é preciso um esforço de imaginação para implantar nele o meu destino mortal. Sinal de convergência de todos os caminhos da vida, do ódio, se sonho, da angústia, dos triunfos - ali. Dos atropelos em que se dão e levam caneladas - um pouco me entretenho num filosofar ligeiro. Das conquistas, das derrotas, dos físicos poderosos de força e de esplendor, e dos físicos estropiados de coxeio e de marrequice - um pouco me entretenho. É uma filosofia fácil, a mais profunda. Com ela se ganhou o paraíso quando o havia para se ganhar e se construíram grandes catedrais do pensar - olho errante na dispersão do horizonte. Dos tísicos que morreram no que se chama a flor da vida e dos que suaram que se fartaram para manterem um corpo vistoso com ginástica e banhos frios e ódio aos farináceos, mas que também morreram que se foderam - meu Deus. O homem é um ser extraordínário. O que ele inventa para ver se é eterno."

Vergílio Ferreira, em "Para Sempre"

Inventar a palavra

"Invento a realidade nas palavras que a inventam - se eu soubesse a palavra dessa realidade. Uma palavra de beleza, de paz, de harmonia. De exaltação esperança evidência. Não a sei. De conforto e altura, de alegria. De loucura mesmo que fosse, qualquer coisa assim, qualquer merda assim, oh, qualquer coisa. Não a ouço, nada a sabe. Vou inventá-la rapidamente antes de alguém ma negar- meu amor. Estou bem necessitado de ti, tanto. Um entendimento à minha volta, e o teu olhar calado, cheio de compreensão caritativa. Criar à minha volta a harmonia que não há não houve, e o torpor do meu sono, e a justificabilidade de tudo na vida, de eu estar aqui, de haver morte no mundo."

Vergílio Ferreira, em "Para Sempre"

Fica-te assim

"Fica-te assim, oh, não te mexas. Tenho tanto que dar uma volta à vida toda. Não te movas. Sob a eternidade do sol e da neve. Uma malícia súbita no teu riso, no teu olhar. Um clarão à volta de deslumbramento. Irradiante fixo. Não te tires daí. Instantâneo na minha desolação. Tenho mais que fazer agora. Não saias daí. A boca enorma de riso, os olhos oblíquos de um pecado futuro. Fica-te aí assim, talvez te procure ainda, talvez te escreva uma carta de amor. Daqui donde estou, está uma tarde quente. De amor. "

Vergílio Ferreira, em "Para Sempre"

Ilusão de seres ainda

"Pena pela tua ilusão de seres ainda. E tu já não és. De construíres um futuro com quem tem um futuro para construir. De te imaginares um ser plausível dentro da tua corrupção. De julgares ser, como de fosses. Olho-te cá de cima com o olhar enxuto de uma vida que se cumpriu. Projectos, fantasias com que se preenche o vazio do que ainda se não preencheu, conquistas do que nunca se conquistou, ainda que se tenha conquistado, mesmo com a amargura do que doeu."

Vergílio Ferreira, em "Para Sempre"

domingo, outubro 30, 2005

Vergílio Ferreira

Para saberem mais sobre o percurso do grande escritor português Vergílio Ferreira (o meu mestre), aconselho os sites: Rota dos Escritores, Instituto Camões, Universal, Virtual e Vergílio Ferreira.

Vida finda

"Vida finda. Mas não perguntes. Sonhos, lutas, e a obsessão do enigma - não perguntes. E do que o ordenasse ao universo - não penses. A palavra ainda, se ao menos. A palavra final. A oculta e breve por sobre o ruído e a fadiga. A última, a primeira."

Vergílio Ferreira, em "Para Sempre"

O homem

"Porque o homem é só o seu futuro. Bem sei. Futuro findo o meu. Já sei. Mas entender isso, entender. Sê calmo - e falas tanto. Organizar a força que te resta. Organizá-la, não para o futuro que já não há, mas para o dia-a-dia que for havendo. Acabar em decência - um velho está tão a mais. Discreto, abrigado no que te sobra de homem - tenho de ir ao andar de cima. Recolhido à tua humildade, à tua miséria sobrevivente."

Vergílio Ferreira, em "Para Sempre"

A última palavra

"Que última palavra me deste? Palavra de amor, de ira, de ordem seca em estalo. Palavra para lembrar. Pela vida inteira, a tua última palavra. A que selasse por uma vez a linguagem do sangue, de um destino comum. Não a recordo. Vejo antes a tua face retraçada de cólera. E os olhos baixos, directos ao chão. Cólera contra ti, contra a vida, contra mim. Forma de talvez me amares na tua dedicação animal."

Vergílio Ferreira, em "Para Sempre"

Corpo

«Oh, porque não chorei e me desfiz em lágrimas para aliviar a minha angústia. Senhor, tu não existes! Pedi-te a tua protecção para ele! Que cuidasses dele por mim. Foi o que te pedi. Mas tu só te ocupas das almas. E o que eu quero dele é o corpo. Nu e quente de amor; fervendo de desejos; esquadrinhando o transparente suspenso do seu. O meu corpo leve e sustido e solto pela sua força. Que farei agora com os meus lábios sem a sua boca para os preencher? Que farei dos meus doridos lábios?»

Juan Rulfo, em "Pedro Páramo"

Este mundo que nos aperta

"- Este mundo, que nos aperta por todos os lados, que vai esvaziando punhados do nosso pó aqui e ali, desfazendo-nos em pedaços como se orvalhasse a terra com o nosso sangue. Que fizemos nós? Porque nos apodreceu a alma? A tua mãe dizia que nos resta, pelo menos, a caridade de Deus."

Juan Rulfo, em "Pedro Páramo"

Espera

«Estive trinta anos à espera de que regressasses, Susana. Esperei até ter tudo. Não só alguma coisa mas tudo o que se pudesse conseguir para que não nos restasse qualquer desejo, só o teu, o desejo de ti.»

Juan Rulfo, em "Pedro Páramo"

segunda-feira, outubro 24, 2005

Juan Rulfo

Para saberem mais sobre Juan Rulfo, escritor mexicano, deixo-vos um site brasileiro, que, além de uma pequena biografia, apresenta um texto deste mesmo autor - "A terra que nos deram".

A minha aldeia

«Encontrarás lá o meu querer. O lugar que eu amei. Onde os sonhos me enfraquecem. A minha aldeia, erguida sobre a planície. Cheia de árvores e folhas, como um mealheiro onde guardámos as nossas recordações. Sentirás que, lá, uma pessoa gostaria de viver para sempre.»

Juan Rulfo, em "Pedro Páramo"

Grito

"Não, não era possível calcular a profundidade do silêncio que aquele grito produziu. Como se a Terra se tivesse esvaziado de todo o ar. Nenhum som; nem o da respiração, nem o do bater do coração; como se o próprio ruído da consciência se tivesse interrompido."

Juan Rulfo, em "Pedro Páramo"

Perdoar

"Que lhe custava a ele perdoar, quando era tão fácil dizer uma palavra ou duas ou cem se estas fossem necessárias para salvar a alma? Que sabia ele do Céu e do Inferno? E contudo, ele, perdido numa aldeia sem nome, sabia quem eram os que tinham merecido o Céu. Havia um catálogo."

Juan Rulfo, em "Pedro Páramo"

Estás tu escondida

«A centenas de metros, acima de todas as nuvens, mais, muito mais além, estás tu escondida, Susana. Escondida na imensidão de Deus, por trás da sua Divina Providência, onde eu não consigo alcançar-te e as minhas palavras não chegam.»

Juan Rulfo, em "Pedro Páramo"

domingo, setembro 11, 2005

Loucura

“Mas também não tenho a certeza de que alguém tenha o direito de dizer o que é a loucura e o que não é. É como se existisse um ser dentro de cada homem que está para lá da sanidade e da insanidade e que assiste aos actos sãos e insanos desse homem com o mesmo horror e o mesmo espanto.”

William Faulkner, em "Na Minha Morte"

Razão para viver

“O meu pai dizia que a razão para viver é prepararmo-nos para ficar mortos.”

William Faulkner, em "Na Minha Morte"

Amor

“Ele também tinha uma palavra. Amor, chamava-lhe ele. Mas eu já há muito que me tinha habituado às palavras e sabia que aquela palavra era como as outras: apenas uma forma para preencher um espaço em branco; é que, quando chegasse a altura certa, não íamos precisar de uma palavra para isso tal como não precisávamos para o orgulho ou para o medo.”

William Faulkner, em "Na Minha Morte"

Palavras

“E quando percebi que trazia o Cash na barriga, percebi que a vida era terrível e que essa era a resposta. Foi quando aprendi que as palavras não servem para nada; que as palavras nunca se adaptam nem mesmo ao que elas querem dizer. Quando ele nasceu compreendi que a maternidade foi inventada por alguém que tinha de arranjar uma palavra para isso, porque as que tinham os filhos não queriam saber se havia ou não palavra para isso. Compreendi que o medo foi inventado por alguém que nunca tinha medo; o orgulho, por quem nunca tinha sentido orgulho.”

William Faulkner, em "Na Minha Morte"

sexta-feira, setembro 02, 2005

"Na Minha Morte" - William Faulkner

Esta obra de William Faulkner é fantástica! Como afirma Isabel Reis, no site Citador, "é difícil escrever sobre um livro que nos deixou uma impressão muito forte, sobre uma escrita que me agarrou e surpreende como a de Faulkner. “Na minha morte” é um romance poderoso, intenso, belo."

Senhor Deus

“Dei-te o que o Senhor Deus me mandou. Encarei-o com temor, não com terror, porque era forte a minha fé no Senhor, para me dar forças e amparo. Se não tens nenhum filho homem, é porque o Senhor assim o decretou na Sua sabedoria. E a minha vida é e sempre foi um livro aberto para todas as Suas criaturas, homens ou mulheres, porque confio no meu Senhor e na minha recompensa.”

William Faulkner, em "Na Minha Morte"

Pensar nisto

“De vez em quando um tipo tem mesmo de pensar nisto (morte). Mas não a toda a hora. E ainda bem. Pois o Senhor quer que ele aja e não que passe o tempo de mais a pensar, porque o cérebro é como uma máquina: não aguenta excessos. O ideal é a gente manter-se no rame-rame e fazer o trabalho de cada dia sem esforçar nenhuma das peças mais do que o necessário.”

William Faulkner, em "Na Minha Morte"

Preocupações

“Eu disse Tu não sabes o que são preocupações. Eu sei o que isso é. Não sei se estou ou não a preocupar-me. Se sou ou não capaz. Não sei se sou capaz de chorar ou não. Não sei se tentei ou não. Sinto-me como uma semente molhada e bravia na terra quente e cega.”

William Faulkner, em "Na Minha Morte"

quarta-feira, agosto 31, 2005

Dinheiro

“Insone, possesso, quase feliz, reflecti que não existe nada menos material do que o dinheiro já que qualquer moeda (uma moeda de vinte centavos, digamos) é, em rigor, um repertório de futuros possíveis. O dinheiro é abstracto, repeti, o dinheiro é tempo futuro. Pode ser uma tarde nos arrabaldes, pode ser música de Brahms, pode ser mapas, pode ser xadrez, pode ser café, pode ser as palavras de Epicteto, que ensinam o desprezo do ouro; (…) uma moeda simboliza o nosso livre-arbítrio.”

Jorge Luis Borges, em "O Aleph"

Palavras

“No meu entender, a conclusão é inadmissível. Quando se aproxima o fim, escreveu Cartapholus, já não restam imagens da lembrança; só restam palavras. Palavras, palavras deslocadas e mutiladas, palavras de outros, foi a pobre esmola que lhe deixaram as horas e os séculos.”

Jorge Luis Borges, em "O Aleph"

segunda-feira, agosto 29, 2005

O Aleph - Jorge Luis Borges

Mais uma vez, para quem estiver interessado, aconselho uma visita ao site Citador, para terem uma ideia desta obra de Jorge Luis Borges.

Sandra

A morte

“A morte (ou a sua alusão) torna os homens preciosos e patéticos. Estes comovem pela sua condição de fantasmas; cada acto que executam pode ser o último; não há rosto que não esteja por apagar-se como o rosto de um sonho. Tudo, entre os mortais, tem o calor do irrecuperável e do fortuito.”

Jorge Luis Borges, em "O Aleph"

Sou e não sou

“Como Cornélio Agripa, sou deus, sou herói, sou filósofo, sou demónio e sou mundo, o que é uma fatigante maneira de dizer que não sou.”

Jorge Luis Borges, em "O Aleph"

quinta-feira, agosto 25, 2005

Palomar - Italo Calvino

Para terem uma ideia da obra Palomar, de Italo Calvino, aconselho uma visita ao site Citador. Se tiverem curiosidade em ler este livro, falem comigo, eu posso emprestar! Ah, e não se esqueçam de fazer comentários. Fiquem bem.

Sandra

quarta-feira, agosto 24, 2005

Estar morto

“Este é o passo mais difícil para quem aprende a estar morto: convencer-se de que a sua própria vida é um conjunto fechado, todo no passado, ao qual não se pode juntar nada, nem introduzir modificações de perspectiva na relação entre os vários elementos. É certo que os que continuam a viver podem, com base nas modificações por eles vividas, introduzir modificações inclusive na vida dos mortos, dando forma àquilo que a não tinha ou que parecia ter uma forma diferente: reconhecendo por exemplo um justo rebelde naquele que tinha sido vituperado pelos seus actos contra a lei, celebrando um poeta ou um profeta naquele que se tinha visto condenar à neurose ou ao delírio. Mas são modificações que contam sobretudo para os vivos. Eles, os mortos, dificilmente tiram delas qualquer proveito. Cada um é feito daquilo que viveu e do modo como o viveu, e isto ninguém lho pode tirar. Quem viveu sofrendo, fica feito pelo seu sofrimento; se pretenderem-lhe tirar-lho, deixa de ser ele.”

Italo Calvino, em "Palomar"

Abre os olhos

“Abre os olhos. O que surge diante do seu olhar parece-lhe algo que viu já todos os dias: ruas cheias de pessoas que têm pressa e que abrem caminho à cotovelada, sem se olharem na cara umas das outras, por entre altas paredes cheias de arestas e de gretas. Ao fundo, o céu cheio de estrelas envia clarões intermitentes, como se fosse um mecanismo encravado, que estremece e range em todas as suas juntas mal oleadas, posto avançados de um universo periclitante, torcido, sem descanso tal como ele.”

Italo Calvino, em "Palomar"

Relações com o próximo

"O senhor Palomar sofre muito por causa das suas dificuldades nas relações com o próximo. Inveja as pessoas que têm o dom de encontrar sempre a coisa certa para dizer, o modo certo de se dirigir a cada um; que estão à vontade com quem quer que se encontrem e que põem os outros à vontade; que, movendo-se com ligeireza entre as pessoas, compreendem imediatamente quando se devem defender e tomar as suas distâncias e quando devem ganhar a simpatia e a confiança dos outros; que dão o melhor de si próprias na relação com os outros e que levam os outros a dar o seu melhor; que sabem logo quando podem contar com uma pessoa, em relação a si próprios e em termos absolutos.

«Estes dotes – pensa Palomar com o desgosto de quem não os tem – são coisas concedidas a quem vive em harmonia com o mundo.»"

Italo Calvino, em "Palomar"

terça-feira, agosto 23, 2005

Sociedade

“Palomar, que dos poderes e contrapoderes espera sempre o pior, acabou por se convencer de que o que conta verdadeiramente é aquilo que acontece apesar deles: a formar que a sociedade vai lentamente adquirindo, silenciosamente, anonimamente, nos hábitos, na maneira de pensar e de fazer, na escala de valores.”

Italo Calvino, em "Palomar"

Boas ocasiões

“Boas ocasiões para ficar calada nunca faltam, mas também acontece que o senhor Palomar lamente não ter dito alguma coisa que teria podido dizer no momento oportuno. Apercebe-se de que os factos confirmam aquilo que ele pensava e que, se então tivesse expresso o seu pensamento, talvez tivesse tido uma influência positiva qualquer, ainda que mínima, sobre o que aconteceu. Nestes casos o seu espírito divide-se entre a satisfação de ter visto com acerto e um sentimento de culpa pela excessiva reserva.”

Italo Calvino, em "Palomar"

Processo de desagregação do mundo

“Todo o processo de desagregação da ordem do mundo é irreversível, mas os efeitos são escondidos e atrasados pela poeira dos grandes números, a qual contém possibilidades praticamente ilimitadas de novas simetrias, combinações, emparelhamentos.”

Italo Calvino, em "Palomar"

Talvez porque o mundo...

“Talvez porque o mundo que existe à sua volta se move de uma forma desarmónica e ele continua a esperar descobrir nele um desígnio, uma constante. Talvez porque ele próprio sente que avança levado por impulsos não coordenados da mente, que parecem não ter nada que ver uns com os outros e que são cada vez mais difíceis de fazer enquadrar num qualquer modelos de harmonia interior.”

Italo Calvino, em "Palomar"

Pessoas

“O senhor Palomar gostaria de colher nos seus olhares um reflexo do fascínio daqueles tesouros, mas as caras e os gestos são apenas impacientes e fugidios, gestos de pessoas concentradas em si próprias, de nervos tensos, preocupadas com aquilo que há e aquilo que não há”.

Italo Calvino, em "Palomar"

Se toda a matéria fosse transparente

“Se toda a matéria fosse transparente, o solo que nos sustém, o invólucro que enfaixa os nossos corpos, as coisas não apareciam como um esvoaçar de véus impalpáveis, mas sim como um inferno de triturações e ingestões. Pode ser que neste momento um deus dos infernos, situado no centro da terra, nos esteja a ver com o seu olho que atravessa o granito, espreitando-nos do lado de baixo, seguindo o ciclo do viver e do morrer, as vítimas dilaceradas que se desfazem nos ventres dos devoradores, até que por sua vez um outro ventre os engole a eles.”

Italo Calvino, em "Palomar"

segunda-feira, julho 04, 2005

Thomas Mann

Nascido a 6 de Junho de 1875, Thomas Mann é considerado um dos maiores romancistas do século XX. Natural do norte da Alemanha, Thomas Mann era filho de um comerciante alemão e de uma brasileira. Após a morte do pai, Thomas Mann abandona a escola e vai morar, com a mãe, para Munique, no sul da Alemanha, onde trabalha numa sociedade de seguros. Todavia, acaba por se dedicar por completo à escrita, a partir de 1895.

Durante dois anos, o escritor alemão fez uma visita ao seu irmão mais velho Heinrich Mann, em Itália, onde começa a escrever "Buddenbrooks". De regresso a Munique, Thomas Mann dedica-se à edição do jornal satírico-humorístico "Simplicissimus".

Com a edição do"Buddenbrooks", em 1901, Mann torna-se famoso. Em 1905, casa-se com Katia Pringsheim, oriunda de uma família judia de intelectuais., com quem tem vários filhos.

Thomas Mann, como patriota, apoiou a entrada da Alemanha na Primeira Guerra Mundial. Neste período, escreve “A Montanha Mágica”. Thomas atinge o auge em 1929, ao ganhar o Prémio Nobel de Literatura.

Em 1933, com a chegada de Hitler ao poder, Thomas Mann emigrou para Küsnacht, próximo de Zurique, Suíça. Perdida a nacionalidade alemã em 1936, Thomas Mann viveu na Suiça até 1939, altura em que se mudou para os Estados Unidos, obtendo a cidadania americana. Thomas Mann voltou à Suiça, em 1952, onde viveu até à sua morte, em 1955.

quinta-feira, maio 26, 2005

O passado não volta

Disseram-me que nesta vida as pessoas acabam por pagar os erros que foram cometendo. Já cometi muitos erros e também tenho sofrido por causa desses erros. Amizades perdidas, principalmente. Quando sofremos alguma desilusão de amor, pensamos sempre por que razão não amamos a pessoa que sempre nos amou e sempre esteve ao nosso lado. Mais tarde ou mais cedo acabamos por reconhecer o valor da pessoa que mais nos amou ou das pessoas que nos amaram incondicionalmente. Mesmo que as tenhamos magoado, rejeitado e afastado da nossa vida, por vezes, de uma maneia cruel, sem qualquer explicação.

O tempo passa, vivemos novas relações e também sofremos uma rejeição ou traição. Aí reconhecemos que, o que se passa connosco, o que de mal nos fizeram, também nós já o fizemos a alguém, no passado. E já é tarde de mais para irmos ao passado buscar o sentimento nobre e autêntico da pessoa que nos amou, porque esse sentimento já lá não está, acabou-se, evaporou-se, o tempo encarregou-se de o apagar desses corações.

E ficamos desiludidos, por mais que tentemos uma aproximação apenas recebemos, se tanto, uma palavra cordial de amizade. E por mais que lamentemos os nossos infortúnios de amor, é a lei da vida, temos de a aceitar como ela é, injusta ou não. Pena os tempos e os sentimentos andarem trocados, seria bom de mais amar e ser amado ao mesmo tempo, com a mesma intensidade.

quarta-feira, abril 13, 2005

"Orgulho e Preconceito"

"É uma verdade universalmente reconhecida que um homem solteiro na posse de uma bela fortuna necessita de uma esposa.

Por muito pouco que se conheçam os sentimentos ou modo de pensar de tal homem ao entrar pela primeira vez na vizinhança, esta verdade encontra-se de tal modo enraizada nos espíritos das famílias circundantes que ele é considerado como propriedade legítima desta ou daquela de suas filhas."

Jane Austen, em "Orgulho e Preconceito"

segunda-feira, abril 11, 2005

"Orgulho e Preconceito" - Jane Austen

A família Bennet tinha a particularidade de ostentar cinco jovens bonitas e solteiras. Com a chegada do Sr. Bingley a Netherfield, logo incendeia a imaginação da Srª Bennet que procura casar a sua filha mais velha, Jane, com o novo e rico vizinho. O Sr. Bingley vem acompanhado pelas suas duas irmãs e também pelo seu amigo Darcy. Este, apesar de aparentar um certo orgulho arrogante, deixa-se levar pelo encantos de Lizzy, a segunda filha dos Bennet, questionando o preconceito de classe que os divide.

Sendo um dos mais
conhecidos livros de Jane Austen, “Orgulho e Preconceito” mostra o mundo mesquinho da pequena burguesia inglesa do séc. XIX, nomeadamente o orgulho e preconceito existentes na sociedade que abalavam as relações da mesma, mas que no final acabam por ceder a razões mais nobres como as do coração.

quarta-feira, março 30, 2005

"O Ano da Morte de Ricardo Reis"- José Saramago

"Aqui, onde o mar acaba e a terra principia. Cidade cinzenta, urbe rasa, sobre colinas, como se só de casas térreas construída, por acaso além um zimbório alto, uma empena mais esforçada, um vulto que parece ruína de castelo, salvo se tudo isto é ilusão, quimera...
Ricardo Reis senta-se numa cadeira, passa os olhos em redor, é aqui que irá viver não sabe por quantos dias.

O Sol branqueado bate nas telhas. Há quintais com alguma roupa estendida, pequenos canteiros de hortaliças cor de cinza, selhas, tanques de cimento, a casota de um cão, coelheiras e galinheiros. O céu lá está, lívido contra a cor plúmea das nuvens, algumas pessoas contemplando os navios, e o rio refulge em reverberações que deslumbram os olhos. Preso à sua pedra o Adamastor vai lançar um grito, de cólera pela expressão que lhe deu o escultor, de dor pelas razões que sabemos de Camões.

Ricardo Reis está sozinho. Nos ramos baixos dos ulmeiros já começaram as cigarras a cantar, são mudas e inventaram uma voz. Um grande barco negro vem entrando à barra, depois desaparece no espelho refulgente da água. Não parece real esta paisagem.

Lisboa é uma sossegada cidade com um rio largo e histórico, um grande silêncio que rumoreja, nada mais. A tarde passou, a noite desceu, mas não faltam por essa cidade lugares onde a festa continua, com luzes, vinho espumoso, ou verdadeiro champanhe, e animação delirante, mulheres fáceis ou nem tanto.

"Então vamos" - disse Fernando Pessoa. "Vamos" – disse Ricardo Reis. O Adamastor não se voltou para ver, parecia-lhe que desta vez não ia ser capaz de dar o grande grito.
Aqui, onde o mar acaba e a terra espera."

José Saramago, em "O Ano da Morte de Ricardo Reis"

quinta-feira, março 03, 2005

Amar ou não amar

Quase todas as pessoas, no mundo, já se apaixonaram, pelo menos, uma vez. Muitos correm atrás do amor e vêem-no estampado no rosto de alguém que passam a considerar deveras especial. Escusado será dizer que a maioria das pessoas também já sofreu por amor. Há imensa gente que se dispõe a fazer mil e uma investidas para conquistar o coração do seu amado e, por vezes, sem sucesso.

Também já me apaixonei e sofri por amor e reconheço que, por agora não estar apaixonada por ninguém, não há coisa mais maravilhosa do que amar alguém, mesmo que esse amor não seja correspondido. Vale sempre a pena sonhar com um príncipe ou princesa, mexer na nossa vida, dar voltas à nossa cabeça, sentir aquele friozinho na barriga quando encontramos a pessoa amada, ficar vermelha/o ou baixar o rosto por timidez ou não saber o que dizer, enfim, tanta coisa que nos acontece quando estamos apaixonados!

Todavia, há igualmente uma parte que não nos deve agradar – a parte da desilusão. Quando conhecemos melhor a pessoa amada e ficamos decepcionados, ou sentimos rejeição nas suas palavras, nos seus gestos, no seu olhar. Pior ainda, quando descobrimos que o nosso amor não é correspondido (coisa que leva o seu tempo a entender) e acordamos para a realidade. Um verdadeiro choque. Tudo se torna diferente e triste. Ficamos perdidos, envergonhados e sem coragem para amar novamente.

quinta-feira, fevereiro 24, 2005

O nosso destino

Enquanto ouço esta música admirável (banda sonora do “Fantasma da Ópera”), recordo os momentos bons que juntos passámos. Já se passaram quase dez anos! E ainda há pouco tempo falávamos de coisas banais, trocávamos mensagens ternas…

Fiz a minha parte, a boa e a má. A má foi por não te ter amado e a boa foi poder amar-te. Tanto uma como outra aconteceram em tempos diferentes. Tanto no passado como no presente estamos separados, há sempre algo que nos afasta, que nos incita a procurar o amor numa outra morada. No entanto, podemos ainda vir a encontrar o verdadeiro amor nos braços um do outro.

Todavia, neste instante, parecemos longe um do outro, divididos pelas dores, pelos medos que sempre amedrontaram a nossa relação. E só Deus poderá decidir o nosso destino. A nós cabe-nos a tarefa de lutar por aquilo em que cremos, ter fé, e muita força na nossa labuta diária. Levantar a cabeça sempre que Deus nos chama para realizar algo. Caminhar ao ritmo do tempo. E ter esperança em relação ao nosso futuro.

Enquanto isso, penso em ti, no sorriso que se apagou, no olhar que se perdeu, na mão que se afastou, na boca que se calou… Olho, pela janela, a noite, e vejo uma luz que brilha na escuridão. Para além do que vejo, sinto que um dia tu (ou alguém como tu) me vais fazer feliz e eu vou ter todo o prazer de te dar todo o meu amor. Mas se ainda me amas, não percas a última oportunidade.

quarta-feira, fevereiro 23, 2005

O amparo de Deus

Há coisas na vida inexplicáveis, como a origem do Homem, o chorar, o rir, o sentir. Aqueles que têm fé, crer que Deus está na origem de tudo, que é a solução para todos os enigmas. Deus, Maria, os anjos e os santos são os nossos protectores. Todavia, torna-se difícil para muita gente ter fé em Deus. Como colocar um ser transcendente num patamar racional, humano? Compreendo aqueles que não têm fé, porque precisam de provas palpáveis, coisa que Deus não dá. Deus exige a fé como prova de amor, dando-nos provas através de milagres, da oração, do nosso próprio destino. Deus está sempre ao nosso lado, mas invisível, como uma estrela que ilumina a noite.

Nós, com a nossa dor e os nossos erros, tornámo-nos sombrios, abandonados, por vezes, perdidos sem sabermos o que fazer. Precisamos de uma luz, de uma força interior que nos incentive a caminhar, a lutar por uma vida digna. Deus é essa força que nos motiva na luta do dia-a-dia, que nos ampara e ajuda nas dificuldades. Podemos não nos aperceber da sua presença, principalmente nos maus momentos, mas ele está sempre lá. E quando a nossa vida corre bem, esquecemo-nos que tal alegria se deve à sua ajuda, ao seu apoio.

E é sempre bom contar com o amparo de quem nos pôs no mundo, de quem rege a nossa vida, determina o nosso destino. Para sermos mais felizes e confiantes, basta crer em Deus, todos os momentos, principalmente naqueles em que nos sentimos mais abandonados e desesperados.

Creio que tudo foi criado por Deus, a terra, o sol, o vento, a chuva, o mar, a natureza e o próprio ser humano. Os humanos só fazem o que Deus quer. Tudo depende da vontade de Deus, o mundo dos vivos e o mundo dos mortos. Um dia, todos nós vamo-nos encontrar, quando Deus decidir acabar com este mundo e decidir levar os escolhidos para outro mundo, numa outra galáxia, onde não haverá pranto nem dor.

Aqui, nesta vida, resta-nos aproveitar cada pequeno momento, torná-lo útil, aprender a viver, sugar o tutano da vida e não esquecer a ajuda de Deus, que está sempre connosco, que tem sempre a sua mão estendida na nossa direcção, pronta a proteger e a perdoar.

quinta-feira, fevereiro 17, 2005

Carta Aberta

Quando te conheci, era uma inocente flor, perdida pelo primeiro amor, encantada com os sonhos que podia realizar. No entanto, não te vi, não te deixei entrar na minha vida, era jovem demais para distinguir o que era bom do que era menos bom.

Cresci desperdiçando o teu amor, afastei-me e segui o meu caminho achando que estava a fazer o que era melhor para mim e para ti. Achei que encontrarias uma pessoa que te amasse, que te desse o devido valor, coisa que eu não fiz.
Ambos crescemos, amadurecemos, vivemos as nossas paixões, sofremos as nossas desilusões, tornámo-nos adultos, com outros projectos, outras perspectivas de vida.

Quando te voltei a encontrar, era uma pessoa completamente diferente e tu parecias o mesmo, sempre atencioso e simpático. Percebi que te magoei muito, que o meu desprezo te fez sofrer. Apesar de, aparentemente, as feridas estarem cicatrizadas, senti que o tempo não podia voltar atrás, não obstante os meus esforços para que voltássemos a ser os mesmos adolescentes ingénuos e sonhadores.

Hoje consigo compreender as pessoas que amam e não são amadas, como num jogo de sorte em que se lançam os dados e uns têm mais sorte do que outros. Não tivemos a sorte de conhecermos o amor um do outro, agora arrumado no passado e mais tarde esquecido pelas investidas do tempo.

Lamento imenso que a nossa relação não tenha resultado, que eu não tenha conseguido conservar intacto o teu amor, que as coisas se tenham perdido, mesmo a esperança...

terça-feira, fevereiro 15, 2005

"Tão veloz como o desejo" - Laura Esquivel

"Amar é um verbo. Demonstramos o nosso amor através de acções. E uma pessoa só se sente amada quando a outra lhe manifesta o seu amor com beijos, abraços, carícias e demonstrações de generosidade. Uma pessoa que ama procurará sempre o bem-estar físico e emocional da pessoa amada.

Ninguém acreditaria que uma mãe ama o seu filho se não o alimenta, se não trata dele, se não o cobre quando está frio, se não lhe oferece os meios para poder desenvolver-se e tornar-se independente.

Ninguém acreditaria que um homem ama a sua mulher se em vez de lhe proporcionar o dinheiro para as despesas o gasta em bebedeiras e em putas. Um homem pensar primeiro em satisfazer as necessidades da sua família e não as suas é um acto de amor. (...)

Assim, vemos que o verbo amar se pode conjugar de duas maneiras. Ou com beijos e carícias ou proporcionando bens materiais. Dar alimento, prover os estudos, vestir e dar um tecto, também se traduz num acto de amor. Dizemos a uma pessoa que gostamos dela quando a beijamos ou quando lhe compramos os sapatos de que precisa tanto. E, nesse sentido, os sapatos cumprem a mesma função do beijo. São uma demonstração de amor. Mas isso não significa que possam converter-se num substituto. Sem amor pelo meio, os bens materiais são uma forma de coacção, de corrupção, de que se valem algumas pessoas para, em troca, obterem os favores do outros.

E se é bem verdade que não só de pão vive o homem, também não pode sobreviver só de amor. Talvez por isso seja tão triste um apaixonado pobre".

Laura Esquivel , em "Tão veloz como o desejo", cap. IV

sexta-feira, fevereiro 11, 2005

Uma vida pela metade - V.S.Naipaul

O último livro que li foi "Uma vida pela metade" de V. S. Naipaul, galardoado como Prémio Nobel de Literatura em 2001. Gostei de o ler. Aqui vão algumas ideias que o livro transmite.

O livro conta a história de dois homens, pai e filho, da sua instabilidade e dos seus fracassos. O pai de Willie Chandram começa por narrar ao filho a sua rebeldia, inspirada por ideais românticos, face à universidade e às tradições da sua família. Assim, começou por largar o emprego, fez um voto de silêncio e acabou por casar com uma mulher de casta inferior mas não conseguiu afastar de si a sensação de inutilidade que o perseguia.

O jovem Willie, depois de ouvir a história do pai, sente-se decepcionado e parte para Londres, onde se torna autor de peças radiofónicas para a BBC. Willie atinge o auge da ficção ao publicar um livro de que não gosta, mas que o leva a frequentar um pequeno círculo de artistas. Todavia, é em Londres que conhece Ana, uma admiradora do seu livro, com quem casa e parte para a terra dela, Moçambique, com o intuito de começar uma nova vida.

Em Moçambique, numa fazenda colonial portuguesa, Willie desempenha o papel de marido, patrão e amigo dos amigos da esposa, ao longo de 18 anos, mas com novas aventuras. A questão é: até que ponto Willie vai viver a vida dos outros? Será que vai viver sempre a vida pela metade?