quarta-feira, março 30, 2005

"O Ano da Morte de Ricardo Reis"- José Saramago

"Aqui, onde o mar acaba e a terra principia. Cidade cinzenta, urbe rasa, sobre colinas, como se só de casas térreas construída, por acaso além um zimbório alto, uma empena mais esforçada, um vulto que parece ruína de castelo, salvo se tudo isto é ilusão, quimera...
Ricardo Reis senta-se numa cadeira, passa os olhos em redor, é aqui que irá viver não sabe por quantos dias.

O Sol branqueado bate nas telhas. Há quintais com alguma roupa estendida, pequenos canteiros de hortaliças cor de cinza, selhas, tanques de cimento, a casota de um cão, coelheiras e galinheiros. O céu lá está, lívido contra a cor plúmea das nuvens, algumas pessoas contemplando os navios, e o rio refulge em reverberações que deslumbram os olhos. Preso à sua pedra o Adamastor vai lançar um grito, de cólera pela expressão que lhe deu o escultor, de dor pelas razões que sabemos de Camões.

Ricardo Reis está sozinho. Nos ramos baixos dos ulmeiros já começaram as cigarras a cantar, são mudas e inventaram uma voz. Um grande barco negro vem entrando à barra, depois desaparece no espelho refulgente da água. Não parece real esta paisagem.

Lisboa é uma sossegada cidade com um rio largo e histórico, um grande silêncio que rumoreja, nada mais. A tarde passou, a noite desceu, mas não faltam por essa cidade lugares onde a festa continua, com luzes, vinho espumoso, ou verdadeiro champanhe, e animação delirante, mulheres fáceis ou nem tanto.

"Então vamos" - disse Fernando Pessoa. "Vamos" – disse Ricardo Reis. O Adamastor não se voltou para ver, parecia-lhe que desta vez não ia ser capaz de dar o grande grito.
Aqui, onde o mar acaba e a terra espera."

José Saramago, em "O Ano da Morte de Ricardo Reis"

quinta-feira, março 03, 2005

Amar ou não amar

Quase todas as pessoas, no mundo, já se apaixonaram, pelo menos, uma vez. Muitos correm atrás do amor e vêem-no estampado no rosto de alguém que passam a considerar deveras especial. Escusado será dizer que a maioria das pessoas também já sofreu por amor. Há imensa gente que se dispõe a fazer mil e uma investidas para conquistar o coração do seu amado e, por vezes, sem sucesso.

Também já me apaixonei e sofri por amor e reconheço que, por agora não estar apaixonada por ninguém, não há coisa mais maravilhosa do que amar alguém, mesmo que esse amor não seja correspondido. Vale sempre a pena sonhar com um príncipe ou princesa, mexer na nossa vida, dar voltas à nossa cabeça, sentir aquele friozinho na barriga quando encontramos a pessoa amada, ficar vermelha/o ou baixar o rosto por timidez ou não saber o que dizer, enfim, tanta coisa que nos acontece quando estamos apaixonados!

Todavia, há igualmente uma parte que não nos deve agradar – a parte da desilusão. Quando conhecemos melhor a pessoa amada e ficamos decepcionados, ou sentimos rejeição nas suas palavras, nos seus gestos, no seu olhar. Pior ainda, quando descobrimos que o nosso amor não é correspondido (coisa que leva o seu tempo a entender) e acordamos para a realidade. Um verdadeiro choque. Tudo se torna diferente e triste. Ficamos perdidos, envergonhados e sem coragem para amar novamente.