quinta-feira, junho 29, 2006

Apontamento

"A minha alma partiu-se como um vaso vazio.
Caiu pela escada execessivamente abaixo.
Caiu das mãos da criada descuidada.
Caiu, fez-se em mais pedaços do que havia loiça no vaso.

Asneira? Impossível? Sei lá!
Tenho mais sensações do que tinha quando em sentia eu.
Sou um espalhamento de cacos sobre um capacho por sacudir.

Fiz barulho na queda como um vaso que se partia.
Os deuses que há debruçam-se do parapeito da escada.
E fitam os cacos que a criada deles fez de mim.

Não se zanguem com ela.
São tolerantes com ela.
O que era um vaso vazio?

Olham os cacos absurdamente conscientes,
Mas conscientes de si mesmos, não conscientes deles.

Olham e sorriem.
Sorriem tolerantes à criada involuntária.

Alastra a grande escadaria atapetada de estrelas.
Um caco brilha, virado parado exterior lustroso, entre os astros.
A minha obra? A minha alma principal? A minha vida?
Um caco.
E os deuses olham-no especialmente, pois não sabem que ficou ali."

Álvaro de Campos


Marianne e Willoughby


"Na primeira visira das Dashwood a Willoughby, ela [Marianne] «dirigiu-lhe um tal olhar de aprovação que, durante o resto da visita, as atenções e palavras dele foram quase exclusivamente para ela [...] Discutia [...] sem timidez ou reserva. Depressa descobriram que o gosto pela música e pela dança era mútuo.» Ele concordava com todas as suas decisões, deixava-se contagiar pelo seu entusiasmo [...]

E Willoughby não só responde ao entusiasmo de Marianne como também cativa todas a pessoas em seu redor, interessando-se por elas, prestando-lhes atenção. Willoughby é o homem na sala de quem todos querem ser amigos, porque parece bastante franco e aprazível, com uma «imaginação rápida, espírito vivo, modos abertos e afáveis [...] Uma aparência encantadora, mas também um espírito naturalmente ardoroso[...]» A família de Marianne adorava-o.

O interesse de Willoughby e Marianne um pelo outro parece totalmente recíproco. «Quando ele estava presente, ela não tinha olhos para mais ninguém. Tudo o que ele fazia estava certo. Tudo o que dizia era brilhante.» E Willoughby está igualmente embevecido: «Se os serões no parque terminavam com um jogo de cartas, ele fazia batota contra si mesmo e todos os outros para dar-lhe a ela uma boa mão. Se o divertimento era a dança, dançavam juntos metade da noite; e quando não podiam fazê-lo, tinham o cuidado de nunca se afastarem muito um do outro, e quase não trocavam uma palavra com quer que fosse.»

Infelizmente, o romance de Marianne e Willoughby não acaba bem: ele casa com outra por dinheiro, apesar de estar apaixonado por Marianne. (...) [Willoughby] mais tarde diz a Elinor: «Os modos interessantes da sua encontadora irmã não podiam deixar de me agradar; e o procedimento dela para comigo foi, quase desde o início, muito amável. [...] Mas confesso que de início apenas me senti envaidecido com a afabilidade dela. [...] Quem poderia resistir a tal atracção, a tal ternura? Algum homem o poderia ter feito? Sim, sem dar por isso, fui-me sentindo cada vez mais atraído por ela.» "

Lauren Henderson, em "Amor e Sedução segundo Jane Austen"

terça-feira, junho 27, 2006

A Educação, a bateria e a especialização

Pela importância do tema vale a pena ler um texto tão extenso. Ele ajudar-vos-á a encarar a educação, os professores e os políticos que temos com "olhos mais críticos".
"Ao contrário da Economia, da Justiça ou da Saúde, em que são habitualmente chamados a pronunciar-se os profissionais da área respectiva, na Educação todos se sentem habilitados a dar palpites sobre o sector e sobre as reformas que são ou não necessárias. Cada vez mais, o estatuto da Educação se assemelha ao do futebol: como toda gente deu pontapés na bola na infância e na adolescência, acha que domina a arte de colocar a bola no fundo da baliza. Na Educação, também todos passámos pelos bancos da escola e/ou somos pais e, por isso, nos sentimos habilitados a dar palpites sobre Educação e a fazer os mais definitivos diagnósticos sobre o sector.
Basta ligar a televisão ou folhear um qualquer jornal, para vermos políticos, economistas, psicólogos, psiquiatras, advogados, jornalistas ou fabricantes de garrafas a pronunciarem-se de cátedra sobre o assunto. E aqui reside o principal erro que se comete em Portugal em matéria de Educação. Há a ideia generalizada de que esta não é uma matéria que exija especialização. Contudo, qualquer professor consciente sabe que, pelo contrário, é um sector que exige uma enorme especialização e experiência.
Há muitos anos atrás, quando um grupo de adolescentes queria formar uma banda de garagem, quem ficava a tocar bateria era quem não sabia tocar nenhum outro instrumento. Hoje a bateria é motivo de teses de mestrado, mas numa época de pouco conhecimento considerava-se que qualquer pessoa era capaz de dar umas batidas nos pratos. Na política portuguesa também é assim: para ministro da Justiça escolhe-se um advogado ou um juiz, para a pasta da Economia escolhe-se um economista, para a pasta da Saúde vai um médico ou professor de Saúde Pública. Para a Educação, vai qualquer um. Não é necessário nem especialização nem o conhecimento do sector. Extraordinário!
Ninguém se lembraria de escolher um veterinário para ministro das Finanças, mas toda a gente achou natural que a economista Manuela Ferreira Leite ascendesse à pasta da Educação. Também toda a gente achou normal que os engenheiros mecânicos Couto dos Santos e Marçal Grilo (este com algum contacto com o sector) passassem a inquilinos do prédio da 5 de Outubro. Ou que David Justino, autarca e professor do Ensino Superior, ocupasse as mesmas funções.
Nada mais pacífico, por isso, que Santana Lopes tivesse convidado uma especialista de telecomunicações para o cargo, com os resultados trágicos que se conhecem. Posto isto, quem se admiraria ao ver José Sócrates convidar uma professora de Sociologia, sem qualquer currículo conhecido na área do ensino básico ou secundário para o cargo? Aliás, parece que todas as profissões dão excelentes currículos para ministro da Educação, excepto uma: a de professor dos ciclos de ensino respectivos!
Quando foi conhecido o nome de Maria de Lurdes Rodrigues para a pasta da Educação, todos se interrogaram quem seria a nova titular, uma vez que ninguém a conhecia. Além de algumas obras publicadas, que nada tinham a ver com o ensino secundário, sabia-se que era presidente do Observatório das Ciências em Portugal. Contudo, logo os jornalistas descobriram uma "qualidade" na nova ministra que a qualificava para o cargo: era conhecido o seu mau feitio. Não demorou muito a que os portugueses descobrissem que o critério "mau feitio" era extensivo aos seus secretários de Estado. Um critério, no mínimo estranho, numa pasta que envolve milhões de pessoas e em que a capacidade de comunicação deveria ser prioritária.
Existem quase 150 mil professores em Portugal a trabalhar no ensino básico e secundário, mas, ao que parece, nenhum sabe suficientemente de educação para desempenhar o cargo. É caso para perguntar o que fazem estes milhares de professores durante dias, meses, anos ou décadas de profissão. Se dia após dia, não se estão a especializar em Educação, então o que estão a fazer?
Aprender a fazer horários, conciliando uma complexidade de factores, não é especialização? Dirigir uma escola não é especialização? Gerir uma turma de alunos desestruturados não é especialização? Contudo, parece que em Portugal, todo este conhecimento fundamental não habilita nenhum dos profissionais de Educação a dirigir o ministério respectivo. Extraordinário!
Ao invés, parece que o que habilita alguém para o cargo é nunca ter dado uma aula na vida no sector que vai dirigir! Ou que não faça a mínima ideia do que sejam as dinâmicas dentro de uma sala de aula. Não será esta sistemática ostracização dos professores, afinal, uma falta de consideração da classe política para com os profissionais de Educação deste País?
Como se pode conceber que conhecer o sistema por dentro nada valha para a classe política? Como se admite que, se não me falha a memória, nem um único professor tenha sido convidado para ocupar o cargo de ministro ou de secretário de Estado neste País nas últimas décadas? Será que aos professores do ensino básico e secundário está reservado o estatuto de menoridade mental e profissional, apesar das provas de bom senso que revelam todos os dias?
Com o devido respeito, enquanto cidadão, considero que os professores têm cumprido incomparavelmente melhor as suas funções do que a classe política. Se alguma dúvida houvesse, bastaria ver o estado em que encontra este País. Por outro lado, convém lembrar que a responsabilidade das políticas educativas erráticas e inconsequentes é da classe política, não dos docentes, que apenas as executam.
Os portugueses têm assistido, com alguma perplexidade, às queixas da senhora ministra da Educação sobre as taxas de insucesso e abandono escolar. Afinal, a um ministro da República não se pede que se queixe, mas que resolva os problemas. Para isso tem, primeiro, de conhecer a realidade. Contudo, os argumentos que a senhora ministra e os seus secretários de Estado têm trazido para a comunicação social mais não revelam que um profundo desconhecimento do trabalho produzido nas escolas.
As questões são simples e quem está no terreno conhece as soluções há muitos anos. O entendimento entre os professores não é difícil e, regra geral há consenso sobre a forma de resolver os problemas. Aliás, os profissionais, seja qual for o ramo de actividade, conhecem sempre muito bem os problemas da sua área de actuação e, por isso, as soluções também são geralmente consensuais. As dificuldades surgem quando aparecem políticos, que não conhecem a verdadeira dimensão dos problemas, a Governar sectores que não dominam. O resultado traduz-se invariavelmente em contestação dos profissionais em causa e medidas avulsas e inconsequentes.
Há anos que os professores deitam as mãos à cabeça com as medidas apresentadas pelos sucessivos governos, cada uma pior que a outra. Com a sua proverbial paciência, professores e conselhos executivos tentam implementar o que, muitas vezes, não tem qualquer viabilidade ou aderência à realidade. Se a autonomia das escolas lhes permitisse rejeitar muitas das directivas absurdas que lhes chegam anualmente, por certo, muito dinheiro pouparia o País e muita eficácia ganhariam as escolas.
Mas vamos às queixas da senhora ministra. Para responder a estes questões, não precisamos de comissões de sábios ou de espertos (tradução livre do Inglês), qualquer professor esclarecido conhece as soluções. Por que motivo os alunos não completam o 12º ano? A resposta é curta e simples: o elevado grau de abstracção dos actuais programas do 12º ano não é compatível com o perfil de uma parte significativa da população escolar.
O problema não está nos alunos nem nos professores nem nos pais nem sequer no sistema de ensino, mas nos programas, que foram criados com a função de preencher anos pré-universitários. Ora, quem não tem perfil universitário - e são muitos - também não tem perfil para frequentar o actual 12º ano. Se o País quer que a generalidade dos alunos completem o 12º ano tem de lhes propor outras competências, de menor abstracção e complexidade, seja através de cursos profissionais ou outros. E ponto final.Volto à questão da necessidade de especialização da escola. O Ministério da Educação olha para a população escolar como uma massa uniforme e, por norma, propõe soluções universais para problemas bem distintos. Erro crasso. Já dizia, Descartes que os problemas complexos se devem decompor em problemas simples, para que se possam resolver.
Ora, com a democratização do ensino, toda a população jovem passou a ter acesso à escola. E com ela chegaram novos problemas às escolas que exigiriam soluções diferenciadas. Contudo, o Ministério da Educação continua a comportar-se como se a população escolar tivesse a mesma homogeneidade de há 30 anos. Não tem. A população escolar de hoje é altamente heterogénea, uma consequência da universalidade do ensino.
Os três nós górdios do ensino secundário
1) O atraso mental ligeiro
Numa linguagem simplificada, eu diria que há três tipos de novos utentes que acederam à escola nas últimas duas ou três décadas e que têm sido ignorados pela classe política. Uma dessas classes, de que nunca se fala, é a população escolar menos favorecida intelectualmente. Não há que ter pudor ou vergonha em falar no assunto, eles existem, há que assumir essa realidade. Há 30 anos, não passavam do 1º ciclo, hoje frequentam o terceiro ciclo e pretende-se que cumpram no futuro 12 anos de escolaridade.
A população escolar não deve ser dividida numa grande maioria, inteligente, e numa pequena minoria, deficiente. Não. Há uma fatia intermédia da população escolar que, não sendo considerada deficiente, possui, no entanto, o que definiria, ainda que sem rigor científico, como grau de atraso mental ligeiro. Todavia, não é politicamente correcto admitir que existem alunos intelectualmente limitados, todos preferem assobiar para o lado e fingir que o problema não existe.
Por certo, até hoje nenhum ministro da Educação se lembrou de pedir o perfil da população escolar em termos de Quociente de Inteligência (QI). Seria um exercício interessante confrontar esses resultados com as exigências dos programas escolares. Ora, o Ministério da Educação continua a exigir a estes jovens menos dotados intelectualmente aquilo a que eles não conseguem corresponder. Numa estimativa meramente empírica, baseado na minha própria experiência de professor, diria que esta população não andará longe dos 10%, o que, concordemos, é um número muito significativo.
Na minha opinião, há que olhar para este problema de forma integrada pois os cursos profissionais apenas o resolverão em parte. Não esqueçamos que, num mundo globalizado, cada vez se exige mais dos profissionais, seja qual for a área. E hoje, exige-se muito a um electricista, um jardineiro ou um mecânico, bem mais do que estes alunos poderão eventualmente dar.
Por isso, mesmo depois de formados, dificilmente estes jovens poderão competir de igual para igual no mercado de trabalho. As limitações intelectuais não desaparecem só porque frequentaram cursos de formação e, por isso, seria importante que o Governo criasse bolsas de trabalho protegidas, quer no Estado quer no sector privado, através de protocolos com as empresas.
Não entendo, por exemplo, porque é que pessoas com QI médio ocupam postos de trabalho no sector da limpeza, quando este, por ser menos exigente, deveria ser um sector de mercado de trabalho protegido dirigido para pessoas de QI baixo, que dificilmente conseguirão emprego estável noutras áreas. O que a sociedade não pode é marginalizar estes jovens nem deixar de lhes oferecer uma colocação profissional compatível com as suas limitações intelectuais. E ao ignorar as suas limitações, o Estado está a empurrar involuntariamente estes jovens para a marginalidade social.
2- a) O mundo das famílias desestruturadas
O segundo tipo de utente que tem acedido à escola nas últimas décadas é o das chamadas famílias desestruturadas. Antes de 25 de Abril de 1974, estes jovens eram perseguidos e marginalizados pelos próprios professores, seguindo as directrizes e as práticas do Ministério da Educação. Se não eram expulsos, eram tão maltratados que acabavam por abandonar as escolas na primeira oportunidade.
Contudo, hoje fazem parte da população escolar e, reconheça-se, de pleno direito. No entanto, mais uma vez, o Ministério da Educação não os reconhece como segmento de população escolar diferenciado e remete a solução dos problemas que causam no normal desenrolar da vida escolar para as escolas, sem os correspondentes meios.
Aqui, as soluções para a resolução deste problema dividem-se. A Alemanha decidiu criar escolas de nível regular, médio e máximo e dar aos pais a opção de escolherem a escola dos seus filhos. A formação dos professores, ao que me informaram, também é diferenciada: os das escolas regulares têm competências reforçadas ao nível do comportamento e integração social e os das outras escolas ao nível científico. Confesso que me inclino, cada vez mais, para esta opção porque é a que mais atenção dá aos diversos públicos-alvo.
A outra opção passa por manter a actual heterogeneidade das turmas. Contudo, também aqui há limites inultrapassáveis, como o número de alunos problemáticos a nível de comportamento por turma. Por norma, um professor consegue gerir satisfatoriamente uma turma com um ou dois alunos problemáticos, mas jamais conseguirá gerir com sucesso turmas com 10 ou 15 alunos problemáticos. Neste caso, o rendimento escolar fica irremediavelmente comprometido. Bem pode o professor "fazer o pino", pois emEducação não há milagres.
Ora, hoje em dia o Ministério da Educação impõe que as turmas só possam ser desdobradas se tiverem mais de 30 alunos, exceptuando se tiverem alunos com algum tipo de deficiência. Ora, os alunos desestruturados não são deficientes e, por isso, hoje há turmas com 10 ou 15 alunos problemáticos integrados em turmas de 30 alunos. O resultado só pode ser trágico, quer para os alunos problemáticos, que não têm a atenção que lhes é devida, quer para os restantes, que não conseguem aprender o que deviam. Obviamente, a culpa aqui não é dos professores, mas das regras absurdas impostas pelo Ministério da Educação.
Ainda nesta opção, é absolutamente indispensável que a indisciplina orgânica não se torne norma na aula. A sala de aula é um local de trabalho, não o prolongamento do recreio. Contudo, cada vez é mais difícil distinguir o recreio da sala de aula. Ou é o auscultador que o aluno coloca mais ou menos discretamente no ouvido, ou é o telemóvel, ou o caderno e o livro que não são trazidos para a aula, ou a conversa irreverente com o parceiro do lado enquanto o professor tenta explicar a matéria, tudo isto perturba enormemente uma aula e reduz drasticamente a aprendizagem.
Ora, esta indisciplina orgânica deve ser muito mais penalizadora para o aluno do que é actualmente. A solução, do meu ponto de vista, passa por criar um núcleo disciplinar dentro de cada escola. Se um aluno desrespeita sistematicamente as regras de comportamento na sala de aula, deve ser obrigado a sair, mas não para regressar 10 ou 15 minutos depois à aula seguinte, continuando a ter o mesmo comportamento. Alguém que é expulso de uma aula por mau comportamento deveria ficar até ao final do horário escolar numa sala disciplinar, acompanhado por dois professores, com o perfil adequado para o efeito. Isto já é feito, com êxito, em escolas americanas.
Outra medida poderia passar pela mudança compulsiva de turma ou até, de estabelecimento de ensino, bastando para tal uma avaliação negativa do comportamento do aluno, devidamente fundamentada, por parte do conselho de turma. Só assim, o combate à indisciplina será suficientemente dissuasor. O actual modelo do processo disciplinar, burocrático, interminável e permissivo, não tem qualquer eficácia e deveria ser reservado apenas a casos de violência, física ou verbal. Muitas vezes, quando chega ao fim o processo disciplinar, já acabou o ano lectivo. E, na maior parte das vezes, a pena é tão simbólica que põe o sistema a ridículo.
2-b) A violência na escola
Ainda dentro do capítulo das famílias desestruturadas, é preciso considerar o caso-limite da violência nas escolas, que afecta, sobretudo, a periferia das grandes cidades. O Ministério da Educação não pode remeter o problema para as escolas, lavando daí as suas mãos como Pilatos. Pior ainda quando decide acusar de incompetência os professores e as escolas em dificuldade, com o extraordinário argumento de que há escolas que têm êxito em situações idênticas.
Aliás, nos célebres vídeos da RTP, a estratégia do secretário de Estado passou (surpresa!) por tentar culpabilizar os professores em causa pela violência nas aulas, quando se percebe claramente que há naqueles alunos uma agressividade perfeitamente anormal que exigiria um apoio especializado acrescido àquelas escolas. Aliás, esta é a estratégia recorrente dos responsáveis do Ministério da Educação: quando algo não está bem, a culpa é invariavelmente dos professores. É a visão simplex da Educação.
No caso dos vídeos na RTP, seria previsível que os responsáveis do ME tomassem medidas para resolver os problemas de violência nas escolas.Todavia, logo surgiu a notícia de que o Ministério iria tentar acusar adirecção das escolas de violação do direito de imagem, apesar de ninguém ser identificado na reportagem. Fantástico!
3- O problema da motivação
Um terceiro grupo problemático é o dos alunos que, devido a problemas de motivação ou bloqueios emocionais não conseguem ter um rendimento escolar normal. Muitas vezes, falta de motivação e de resultados não implica mau comportamento nas aulas. Muitos factores podem estar associados a estes problemas. Um deles é conhecido como hiperactividade ou défice de atenção. Segundo o pedopsiquiatra Nuno Lobo Antunes, 7,5% da população escolar tem este problema. Numa escola de 1300 alunos, 100 alunos sofrerão assim deste problema. Uma multidão.
E qual é a resposta do Ministério da Educação para este problema, que exige tratamento médico especializado? A informação que tenho é que a única consulta do Estado na região, localizada no Hospital de Leiria, tem uma lista de espera de 7 meses... No sector privado, uma consulta daespecialidade pode chegar aos 100 euros, bem longe do alcance da maioria dos pais.
Diante deste cenário, que razão tem a senhora ministra da Educação para se queixar dos maus resultados escolares dos alunos? Além destes, existem muitos outros problemas de saúde que explicam o baixo rendimento dos alunos, como dislexia, problemas de visão, audição, etc., muito mais frequentes do que se pode imaginar e que dificilmente os professores conseguem detectar.
Ainda relativamente à motivação, que soluções propõe o Ministério da Educação para os inúmeros casos de falta de acompanhamento dos alunos por parte dos pais? É um erro de palmatória pensar que os professores podem substituir os pais no acompanhamento parental. Com 5 ou 6 turmas de 25 a 30 alunos e horários rígidos, perfazendo 100 a 150 alunos a seu cargo diariamente, os professores não têm nem tempo nem vocação para fazer esse acompanhamento. O resto não passa de fantasias delirantes. Ponto final.
A "solução" do Ministério da Educação de alargar os horários escolares para permitir o melhor acompanhamento desses alunos dificilmente terá qualquer eficácia. Primeiro, porque não é em 45 minutos ou mesmo 90 minutos que se consegue dar o mínimo de acompanhamento parental a grupos de 5, 10 ou 15 alunos. Em segundo lugar, mais horas num horário escolar já sobrecarregado soa como um castigo extra para os alunos, que, ao fim do dia, já estão cansados e stressados e só querem ir para casa descansar.
Outra medida inconsequente são as chamadas aulas de substituição. Se elas são compreensíveis no 1º ou 2º ciclo, dada a tenra idade dos alunos, que exige uma supervisão apertada, o mesmo não acontece no 3º ciclo e no ensino secundário, onde os alunos já dispõem de razoável autonomia. O argumento da senhora ministra de que se os alunos não estiverem na sala de aula andam pelos cafés a embebedarem-se não colhe.
Em primeiro lugar, se as escolas não estão vedadas, é obrigação do Ministério da Educação fazê-lo. Os alunos devem permanecer no espaço escolar durante o tempo do horário escolar. E a esmagadora maioria dos alunos portugueses não são bêbados nem toxicodependentes, são jovens que precisam de brincar e de socializar, coisa que sempre fizeram de forma saudável. Com esta medida, a senhora ministra impede os alunos de o fazer no recreio. A consequência é que transformam o espaço da sala de aula, que deveria ser sagrado e reservado ao estudo, no recreio. Os resultados desta medida em termos de cultura escolar são, obviamente, catastróficos.
As medidas piedosas e populistas do Ministério da Educação, que podem parecer óptimas para pais e leigos na matéria, traduzem-se afinal em mais custos para os contribuintes e resultados nulos. Este é mais um exemplo de que a Educação precisa de especialização e que os especialistas deste sector não são gestores, sociólogos ou engenheiros mecânicos, mas professores.
E, já agora, qual é a penalização (ou incentivo) para os pais que nem sequer vão à escola quando são solicitados? Será que o sucesso educativo não passa pela responsabilização de todos os intervenientes no processo educativo? Muito francamente, não me parece sério um discurso que só procura responsabilizar uma das partes e se demite totalmente de responsabilizar os outros intervenientes no processo. Ou será que o Ministério da Educação optou por afrontar apenas os professores por serem apenas 150 mil e não tem coragem de responsabilizar pais e alunos, por estes serem 3 ou 4 milhões?
A avaliação dos professores
a) Os "maus professores"
Em quase 20 anos de ensino, contam-se pelos dedos de uma mão os comportamentos não responsáveis de professores que observei. Por isso, é com perplexidade que ouço falar da necessidade de punir os "maus professores". De que País estamos a falar: da Somália, do Sudão ou do Burkina Faso?! Com certeza os professores são humanos, terão seguramente personalidades muito diferentes, qualidades e defeitos, mas, se há classe que me mereça confiança, é a dos professores.
De resto, numa profissão sujeita ao escrutínio de tanta gente, dificilmente algum professor não cumprirá as suas obrigações. Qualquer aluno, encarregado de educação ou professor se pode queixar ao conselho executivo da escola e todas as queixas são tidas em conta, consideradas e dado o devido encaminhamento. Os casos poderão depois ser passados à inspecção que os analisa a pente fino e, mesmo assim, raras são as condenações de professores.
Só quem não percebe nada do que são as escolas portuguesas - e muitos são, incluindo a maioria dos jornalistas - consegue acreditar na fantástica tese de que o problema do ensino secundário reside na qualidade dos professores. Lembro que a quase totalidade dos professores são pessoas formadas e, como já sublinhei, têm de dar diariamente provas de bom senso. Na verdade, o que falta nas escolas são regras eficazes a todos os níveis e flexibilidade na gestão.
Por isso, é lamentável que a campanha de difamação dos professores parta precisamente dos responsáveis do Ministério da Educação. E mais lamentável ainda é que num dia lancem lama sobre a classe, para logo no dia seguinte virem dizer que não era bem assim, e que a culpa é do jornalista que deu a notícia. A senhora ministra acusou os professores de só se preocuparem com as boas turmas e de as colocarem de manhã para os funcionários da escola colocarem lá os seus filhos. Ora, isto é uma acusação claríssima de corrupção.
Em quase 20 anos de profissão, nunca observei tal prática e, por isso, considero que a senhora ministra difamou os professores. Em primeiro lugar, com a natalidade em queda, não me parece que os professores tenham assim tantos filhos e menos ainda na escola onde leccionam. Da minha experiência, cada escola talvez tenha em média dois ou três filhos de professores a estudar na mesma escola enquanto há 20 ou 30 turmas por escola. Além disso, muitos são os professores que têm os filhos a estudar noutras escolas, públicas ou privadas.
Por aqui se vê que essa acusação não tem qualquer base de sustentação. No entanto, a ser verdade esta prática nalguma escola, a obrigação da senhora ministra era mandar a Inspecção averiguar, não lançar lama contra uma classe profissional inteira.
Por outro lado, a comparação dos professores com os médicos é, uma vez mais, reveladora do desconhecimento que a senhora ministra tem da profissão docente no ensino secundário. A cura da doença dos pacientes só depende do médico, mas a aprendizagem dos alunos não depende só do professor. Só pordesonestidade intelectual e/ou leviandade se podem comparar situações tão distintas.
b) A avaliação fantasma dos pais
Os alunos não aprendem por um conjunto variado de factores, que já atrás referi, e dos quais o Ministério da Educação é o principal responsável. Os professores fazem o melhor que podem e sabem. De resto, a intenção persecutória dos responsáveis do Ministério da Educação contra os professores e as suspeitas públicas quanto ao seu profissionalismo são claras. A última afronta é a proposta de Estatuto da Carreira Docente.
Com efeito, a proposta de avaliação dos professores por parte dos encarregados de educação parte da suspeita não confessada de que os professores não são responsáveis. Assim, os pais (supostamente cidadãos responsáveis) controlariam os professores (supostamente profissionais irresponsáveis). A medida, tão populista como perversa, mereceu a reprovação da maior parte dos partidos, do Bloco de Esquerda ao CDS, e até da generalidade dos comentadores, sempre tão benevolentes com os actuais responsáveis da 5 de Outubro.
A proposta não sobrevive ao mais rudimentar escrutínio. Primeiro, como podem os pais avaliar professores, se nem sequer os conhecem? Por outro lado, se não os conhecem, as informações em que se baseiam são transmitidas pelos filhos, de 10, 13 ou 16 anos! Ora, que maturidade tem uma criança ou adolescente para avaliar um professor?
Por outro lado, é preciso não esquecer que entre professor e aluno também existe uma relação de poder. E deixar na mão de um adolescente o poder de avaliar o educador é uma total perversão. O poder do educador não pode ser diminuído pelo receio de uma revanche do aluno. No limite, uma turma de marginais terá o professor na mão, porque se este os afrontar leva com uma avaliação negativa e o seu salário será diminuído. Em termos de relação de poder, é como se um juiz passasse a ser avaliado pelas pessoas que tem de julgar! Um completo absurdo.
E nem a tentativa da senhora ministra de tentar fugir à questão, dizendo que este é apenas um acto de avaliação, entre muitos outros, é minimamente admissível. Não é por ter menos peso que a proposta se torna mais séria ou aceitável! Além disso, um trabalhador não pode ver o seu desempenho avaliado por factores subjectivos, de que nunca poderá recorrer, deve ser avaliado em função de critérios objectivos. A avaliação profissional é uma coisa séria, não pode ser uma lotaria.
A insinuação de que os professores não querem ser avaliados é outra peça na campanha contra a classe que circula pelos média. A verdade é que os professores já eram avaliados até aqui, dependendo a aprovação da frequência de acções de formação e do cumprimento das tarefas atribuídas. É certo que o processo de avaliação não era muito exigente, mas a responsabilidade é, naturalmente, dos responsáveis do Ministério da Educação que aprovaram essa legislação, não dos professores, que se limitaram a cumprir o estipulado.
c) O mito da falta de assiduidade
Faço aqui um parêntesis para abordar a questão da assiduidade, que tem sido alvo de uma campanha demagógica contra a classe docente. Em primeiro lugar, o ensino é uma profissão maioritariamente de mulheres. Ora, tradicionalmente, quem cuida dos filhos quando estes estão doentes são as mulheres, sem falar que mulheres engravidam e, por isso, também têm por vezes de faltar por razões de saúde. Por isso, é natural que a assiduidade seja menor entre os professores que noutras profissões. Qual é a alternativa? Querem que as professoras deixem os seus filhos ao abandono?
Por outro lado, a falta de um professor tem uma repercussão social ampliada. Quando um funcionário falta numa repartição o utente raramente dá por isso. No caso dos professores, quando um deles falta um único dia, há 150 alunos que dão pela sua falta e que contam a 300 pais. No total, a falta de um único professor é notada por quase meio milhar de pessoas.
Por outro lado, não entendo porque os professores não podem repor as aulas em que têm de faltar. Bastaria que, para tal, fosse marcado no horário escolar uma mancha para esse efeito. Aqui está um mecanismo de gestão que, incompreensivelmente, não é utilizado e que poderia minorar bastante os efeitos das ausências pontuais dos professores.
Por outro lado, é preciso entender que os professores têm horários extremamente rígidos e a um simples atraso de 5 minutos, devido a trânsito intenso ou outro motivo imprevisto, pode corresponder uma falta de um dia inteiro, se essa for a única aula do dia, ou, no mínimo, a ¼ de dia de falta. Quantos profissionais deste País têm penalizações tão gravosas, embora compreensíveis, por atrasos de 5 minutos?
Além disso, é uma profissão muito exigente em termos de cansaço e desgaste psíquico. Um dia inteiro a lidar com adolescentes irreverentes é uma tarefa duríssima, sobretudo, quando se tem de lidar com turmas problemáticas, sem falar no trabalho que os professores levam para casa. Por isso, por vezes, quando um professor está "de rastos", nada mais lhe resta que parar um dia, mesmo perdendo um dia de férias, para recuperar energias ou até a sua sanidade mental.
Seguramente, não é por causa da assiduidade dos professores que o ensino está mal. A única excepção sucede quando um professor está de atestado médico menos de um mês, uma vez que a legislação só permite a substituição se a ausência for igual ou superior a um mês. O incumprimento do programa agrava-se ainda mais quando a instabilidade da saúde professor o leva a pôr sucessivos atestados médicos de curta duração.
São casos raros, mas acontecem e penalizam bastante os alunos. No entanto, cabe ao Ministério da Educação modificar essa legislação e encontrar soluções mais criativas para que os alunos não fiquem sem aulas tanto tempo.
d) Avaliação sim, mas objectiva
De qualquer forma, quem não deve não teme e os professores não têm qualquer problema em ser avaliados, desde que os critérios sejam objectivos e estejam relacionados directamente com o seu trabalho. Não é aceitável que a sua avaliação dependa dos resultados dos alunos, pela simples razão de que os resultados dependem de muitos outros factores, além do trabalho do professor.
Por exemplo, um professor com turmas problemáticas nunca pode ter os mesmos resultados que um professor com bons alunos. Por outro lado, isso seria mais um convite ao facilitismo porque, naturalmente, pressionaria os professores a inflacionar as classificações dos alunos.
Por outro lado, é clara a intenção deste Governo ao fixar numerus clausus no acesso ao topo da carreira e não querer pagar aos professores, independentemente do seu mérito ou competência. Ora, como quer o Governo atrair para a carreira bons profissionais se não lhes paga em consonância? A proletarização da classe docente é uma realidade típica de países de Terceiro Mundo, não de países civilizados. E mal vai Portugal se tenciona continuar a desvalorizar a profissão de professor.
Parafraseando a magnífica frase de Medina Carreira há alguns dias na RTP, também "eu gosto dos determinados, mas é quando acertam." Como já aqui demonstrei, a nomeação desta equipa da Educação é um monumental erro de casting e o País vai pagar caro a política populista e voluntarista que está a ser seguida neste sector. Em vez de mobilizar energias, Maria de Lurdes Rodrigues mais não faz do que incendiar o País e comprar guerras inúteis e despropositadas com os professores.
O descrédito da actual equipa da Educação é total nas escolas portuguesas e, por mais que isto custe a José Sócrates, tal não se deve a questões salariais, mas ao facto da sua competência não ser reconhecida. Não se governa um País com base em estatísticas, sobretudo, quando não se percebe o que está por detrás desses números. E quanto mais Maria de Lurdes Rodrigues brande desajeitadamente as estatísticas, mais expõe a sua ignorância e se põe a ridículo aos olhos dos professores. E muito mal vai uma organização quando os subordinados não reconhecem a competência do chefe.
Mário Lopes

terça-feira, junho 20, 2006

Mr e Mrs Palmer


"Nem o de Mr. Palmer, em Sensibilidade e Bom Senso. Também ele percebeu depois do casamento que, «devido a uma qualquer inexplicável parcialidade pela beleza, estava casado com uma mulher muito parva».

Mr. Palmer é resmungão e carrancudo, mas a constante tagarelice da mulher seria suficiente para tornar qualquer pessoa rabugenta.

Jane Austen está constantemente a avisar-nos de que se nos deixarmos encantar com a beleza de uma pessoa por quem temos um fraco, podemos não ser capazes de fazer dela o juízo mais acertado."

Lauren Henderson, em "Amor e Sedução segundo Jane Austen"

Willoughby



"[Willoughby] Admite que só seduziu Marianne para se divertir durante as poucas semanas que passou no campo. E o que acontece? Ele é apanhado na própria armadilha. Querendo apenas seduzir Marianne, apaixona-se verdadeiramente por ela e vê-se em sérios apuros.

Não pode pedi-la em casamento porque não tem meios suficientes para sustentar uma mulher. Por isso regressa a Londres e pede as mãos de uma rapariga rica que não ama. Isto detroça o coração de Marianne, e ela entra numa espiral descendente que quase a mata; e Willoughby encurralou-se num casamento desastroso com uma mulher de que não gosta e que não respeita. Pior ainda, descobre demasiado tarde que, se se tivesse mantido fiel ao seu amor por Marianne, afinal talvez tivesse dinheiro para sustentar ambos - a sua tia rica aprovaria a sua paixão por uma rapariga respeitável e ter-lhe-ia proporcionado um rendimento suficiente para as suas necessidades.

Willoughby nunca tencionara levar Marianne a sério. Estava apenas a fazer o que normalmente fazia para passar o tempo - a namoriscar para se divertir. Sabia que não podia dar-se ao luxo de se apaixonar por uma rapariga pobre, pelo que andava à procura de uma com rendimentos razoáveis.

A sua paixão por Marianne apanhou-o completamente desprevenido - e foi apenas culpa sua. Se não tivesse começado a seduzir Marianne praticamente no momento em que a conheceu, respondendo de forma entusiástica ao interesse óbvio que ela tinha por ele, nunca a teria vindo a conhecer suficientemente bem para se apaixonar por ela. A atracção inicial de ambos nunca se transformaria em algo mais sério.

Willoughby poderia ter-se contido, mantendo-se a si e a Marianne para pensar que devia protegê-la de si próprio. Willoughby incita Marianne e acaba ainda pior do que ela; preso num casamento sem amor com uma mulher (compreensivelmente) ciumenta, ao passo que Marianne fica com o coronel Brandon, um bom homem que a ama e que toma conta dela."

Lauren Henderson, "Amor e Sedução segundo Jane Austen"

Edward Ferrars: tímido e reservado


"Enganado pela intriguista Lucy Steele quando ainda era estudante e demasiado novo para entender o que se passava, Edward Ferrars deixou-se enredar num noivado deveras precipitado.
Agora que está apaixonado por Elinor Dashwood, reconhece a diferença que existe entre uma mulher como Lucy, interessada apenas em caçar um marido rico, e uma mulher como Elinor, que o ama por aquilo que é.

A calma e controlada Elinor sabe que Edward tem um bom coração, mas que precisa de ajuda e incentivo para encontrar o caminho certo na vida, e está preparada para o auxiliar nessa tarefa.

A profissão de vigário de aldeia é perfeita para Edward, que não tem qualquer desejo de se distinguir, mas apenas anseia por uma vida calma junto da mulher que ama.

O seu sentido de honra não lhe permite romper o noivado com Lucy, por muito que o deseje fazer, e este seu comportamento está de acordo com a moral da época.Todavia, quando Lucy foge [acho que autora quer dizer casa] com o irmão de Edward, o caminho fica livre para Edward e Elinor. Assim que se vê livre do seu compromisso, apressa-se a pedir Elinor em casamento.

Embora tímido, é capaz de perseguir aquilo que deseja e é com grande felicidade que Elinor o aceita."

Lauren Henderson, em "Amor e Sedução segundo Jane Austen"

Willoughby: demasiado bom para ser verdade


"Willoughby é o tipo de homem do qual devemos fugir a sete pés, se formos perspicazes o suficiente para o detectar. É encantador, deslumbrante, abastado, bem relacionado e encanta a sua família de forma a que também ela fique apaixonada por ele. Fala e age da forma mais correcta. E depois... desaparece.

É claro que o faz por uma razão, porém, quando a descobrimos, já temos o coração despedaçado. O único consolo é que Willoughby também sofre com tudo isso. Envolve-se mais do que pretendia e o que devia ser apenas um namorico divertido e passageiro transforma-se numa paixão correspondida.

Willoughby é tão bom naquilo que faz que toda a gente se deixa encantar por ele, incluindo ele próprio. Todavia, é uma terrível lição. Se alguém parecer demasiado bom para ser verdade... então, provavelmente não o é."

Lauren Henderson, em "Amor e Sedução segundo Jane Austen"

Elinor: autodomínio


"Elinor procede da forma mais acertada. Consciente da delicadez económica da sua situação - Elinor não tem dinheiro, ao passo que o homem que ama, Edward Ferrars, não tem emprego e depende inteiramente do dinheio que a sua controladora mãe lhe dá -, sabe que é muito improvável que alguma vez possam casar. Assim, mantém silêncio quanto aos seus sentimentos.


A atenção que dedica a Edward é mínima; ao contrário de Marianne, nunca será alvo da chacota de toda a Londres. E nem os acontecimentos enfraquecem o seu bom senso.
Apesar da notícia do noivado de Edward com Lucy Steele, sabe que ele a ama, pois avaliou-o e ao seu comportamento acertadamente. No final, as circunstâncias alteram-se e acaba por ficar com Edward - com apenas um pequeno rendimento, mas Elinor é sensata o suficiente para achar que a vida é fácil."


Lauren Henderson, em "Amor e Sedução segundo Jane Austen"

Marianne: a romântica incurável


"Marianne lança-se de braços abertos ao amor que sente pelo formoso e encantador Willoughby na segunda vez que o encontra, e a sua paixão, em conjunto com a sua beleza e encantos, é o suficiente para que ele se apaixone também por ela.
Marianne quer que todo o mundo saiba do seu amor. Não aprendeu ainda as difíceis lições da discrição e da prudência.


A fim de sermos justas para com ela, temos de admitir que a princípio Willoughby encoraja-a a lançar a cautela para trás das costas, mas assim que ele parte abruptamente para Londres, sem lhe fazer a proposta de casamento que ela, com razão, esperava, Marianne devia ter-se retraído, resguardado as suas emoções e protegido a si mesma. Pelo contrário, lança-se imprudentemente de cabeça em direcção ao abismo, de coração aberto, e sofre uma catastrófica rejeição, que acaba quase por ser a sua morte."


Lauren Henderson, em "Amor e Sedução segundo Jane Austen"

Coronel Brandon: a paciência


"Pobre coronel Brandon, perde a primeira mulher por quems e apaixona e depois tem de esperar por Marianne ao longo de todo o seu drama com Willoughby!

Por fim, a sua constância é recompensada, bem como o seu tacto. O coronel Brandon é inteligente e sensível o suficiente para não pressionar Marianne quando a vê fragilizada ou ainda apaixonada por outro homem.


Espera pacientemente até que ela esqueça Willoughby o mais que possa. É uma excelente lição para todas nós. A paciência é a chave para a felicidade."


Lauren Henderson, em "Amor e Sedução segundo Jane Austen"

"Amor e Sedução segundo Jane Austen"


Descobri mais um livro sobre Jane Austen, mas este é diferente, não é mais um romance ou uma crítica literária, é apenas uma forma curiosa de interpretação das obras de Austen.

O título é simplesmente sugestivo "Amor e Sedução segundo Jane Austen", a autora é Lauren Henderson. O título não engana, o conteúdo fala mesmo de amor e sedução, com conselhos inspirados nos romances de Jane Austen, particularmente no comportamento das principais personagens.

O que se pode "aproveitar", neste contexto (para este blog), são os retratos que Lauren Henderson faz de algumas personagens, e é só nisso que me vou concentrar. O resto são reflexões pertinentes para mulheres apaixonadas (ou desesperadas).

Para "abrilhantar" estes comentários vou incluir algumas imagens do filme de Ang Lee (Sense and Sensibility)

terça-feira, junho 13, 2006

Triste fado!!

Crónica

eram barcos e barcos que largavam
fez-se dessa matéria a nossa vida
marujos e soldados que embarcavam
e gente que chorava à despedida

ficámos sempre ou quase ou por um triz
correndo atrás das sombras inseguras
sempre a sonhar com índias e brasis
e a descobrir as próprias desventuras

memória avermelhada dos corais
com sangue e sofrimento amalgamados
se rasga escuridões e temporais
traz-nos também nas algas enredados

e ganhou-se e perdeu-se a navegar
por má fortuna e vento repentino
e o tempo foi passando devagar
tão devagar nas rodas do destino

que ou nós nos encontramos ou então
ficamos uma vez mais à deriva
neste canto que é nosso próprio chão
sem que o canto sequer nos sobreviva

Letras do Fado Vulgar

Vasco Graça Moura

1942 Nasceu no Porto. Licenciado em Direito pela Universidade de Lisboa. Ocupa actualmente um cargo directivo na Fundação Gulbenkian. Tradutor, ensaísta, poeta e romancista.

sábado, junho 10, 2006

Ainda a Trompa

"Até a invenção das válvulas ou pistões que ocorreu entre 1814 e 1815, várias tentativas se fizeram para aumentar as possibilidades da trompa. Para a distinguir da trompa natural, chama-se também, por vezes, trompa de pistões, cromática ou trompa de harmonia. Uma característica essencial do tubo é, ser estreito e muito longo (mais de 4 metros); é isto que permite a obtenção de muitos harmónicos (até ao décimo-sexto). Na região aguda é difícil controlar a nota produzida, pois a menor imprecisão na conveniente articulação dos lábios dá origem a uma nota errada ou destimbrada.

Na trompa cada nota pode ser obtida através de um maior número de posições diferentes que nos outros metais. Ao contrário de todos os outros instrumentos que têm pistões, na trompa é com a mão esquerda que se actua sobre eles, porque continua a ser preciso introduzir a mão direita na campânula para obter os sons bouchés e para segurar o instrumento.

A sua extensão e de quase quatro oitavas, de Sol (-1) a Fa (4), embora as quatro notas mais graves sejam difíceis de obter, devendo ser evitadas pelos compositores em passagens rápidas.

A trompa está afinada em Fá. Para emitir as notas da região aguda, convinha que existisse uma trompa com o tubo mais curto: o modelo em Sib. Em 1935, apareceu no mercado o modelo moderno de trompa, que funciona como trompa em Fá e como trompa em Sib, alternadamente, sendo chamada trompa de afinação dupla. Para isso é dotada de uma 4ª Válvula que corta a ligação de uma certa extensão do tubo, fazendo com que o instrumento passe a tocar uma quarta acima.

A trompa natural continua ainda a ser usada, não só para a interpretação de música antiga mas também pelo seu extraordinário timbre, algo diferente do da trompa actual. Prova do grande interesse que este instrumento hoje desperta é o Concurso Internacional de Trompa Natural que se realiza em Bad Hzarzburb, na Alemanha.

A trompa pode usar uma surdina em forma de pêra e que pode ser de metal, madeira ou cartão permitindo obter um timbre diferente. Na trompa natural o instrumentista intrduzia a mão na campânula, tapando-a em aproximadamente ¼, ½ ou ¾ da sua área, de modo a obter sons fora da série dos harmónicos. Mas tapando com a mão obtém-se os chamados sons bouchés. Estes têm uma sonoridade muito diferente.

Outro efeito sonoro da trompa é o som cuivré, que se obtém com uma tensão maior que a normal e um sopro muito forte. Isto origina a vibração do metal, produzindo assim um som muito característico. Os sons cuivré são de grande efeito dramático.

Em relação à sonoridade da trompa convém salientar que ela é o único instrumento tratado como uma madeira e como um metal; na escrita para orquestra ela é associada principalmente aos metais, mas também às madeiras, com as quais liga perfeitamente; na música de câmara a trompa é membro permanente do quinteto de sopro, juntamente com a flauta, o oboé, o clarinete e o fagote. Além disso, a trompa resulta muito bem em combinações instrumentais bastante diversas; por isso, ela tem um status único entre os instrumentos da orquestra."

Trompas e Companhia

A Trompa

"A trompa é um instrumento de sopro da família dos metais, indispensável na orquestra sinfónica moderna. Consiste num tubo metálico de 3,7 metros de comprimento, ligeiramente cónico, com um bocal numa das extremidades e uma campânula na outra, enrolado várias vezes sobre si mesmo como uma mangueira, e munido de três chaves (cilindros).

É um instrumento dificílimo de tocar: o trompista não só tem que ter um ouvido afinadíssimo e saber solfejar com precisão, como também tem que ter uma coordenação motora perfeita para controlar os músculos da mão direita e a própria respiração. Basta um pequeno erro para produzir uma desafinação.

O que distingue as madeiras dos metais é que as madeiras têm o som mais doce e mais delicado, enquanto os metais o têm mais poderoso e ribombante. Dizemos que os metais são a "artilharia pesada" da orquestra. O que torna a trompa tão especial, e dá ao instrumento seu charme irresistível é que, embora tenha a robustez dos metais, a trompa tem também muito da delicadeza das madeiras. O som doce e quente da trompa tem fascinado quase todos os compositores.

A trompa moderna se originou na trompa de caça (corno di caccia), um instrumento usado pelos caçadores na Idade Média. Quando grupos de homens saíam para caçar, eles levavam consigo este instrumento, para poderem chamar-se uns aos outros e se localizar no meio da floresta. No princípio, o instrumento era muito simples, não passando de um tubo metálico enrolado, com um pavilhão numa extremidade e o bocal na outra. Mais tarde, alguém descobriu que poderia produzir diferentes notas, controlando o fluxo de ar dentro do instrumento. No século XIX, um engenheiro alemão chamado Stoetzel teve a ideia de adicionar as chaves, tornando mais prático o manejo do instrumento. A trompa moderna tem uma extensão de três oitavas e meia e pode tocar todas as notas da escala cromática."

Wikipédia

Ligações:
Portal dos Trompistas
Ricardo Matosinhos

quinta-feira, junho 01, 2006

O guerreiro da humanidade

Esta noite sonhei contigo. Estavas lindo como sempre, com os cabelos ao vento, a barba por fazer e, claro, com a tua expressão única, autêntica, envolvente. O teu olhar denunciava a raiva contra as injustiças. Estavas decidido. Nada te iria impedir de lutar pela libertação dos oprimidos. Nem um grande amor, nem a probabilidade de isso custar a tua própria vida.

Olhas-me nos olhos e dizes desesperadamente:
- Chega de injustiças! Não posso mais ficar parado!
- Mas isso implica demasiados riscos…
- Alguém tem de fazer alguma coisa! Estou disposto a tudo! Mesmo a morrer!


Sais apressado, levando contigo a tua maior arma: a palavra. Viajas pela Ásia, pela América Latina e, por fim, África. Ao teu redor juntam-se multidões que te querem ouvir, não fosses tu o profeta da liberdade, a imagem da esperança num futuro melhor. Falas-lhes no fim da pobreza, da miséria, no livre acesso aos cuidados de saúde, à educação e à cultura. Não haverá mais fome, guerra, ignorância, violência, exploração… Carregas os maiores sonhos dos românticos, dos heróis rebeldes, dos artistas utópicos.

Em ti está a expressão dos grandes pensadores da história da humanidade, o coração dos apaixonados pelos ideais, pelas grandes causas e revoluções, o desejo daqueles que querem apenas ser felizes.

Mais do que o sonho de ter o teu amor, necessito mais da tua realização, da tua capacidade de servir grandes causas, de ver tem ti estampada a força de um guerreiro, a esperança de um mundo melhor.

Sandra Bastos